Lucas Torres [email protected]
A demanda por um maior engajamento das empresas do Aftermarket Automotivo brasileiro nas pautas de sustentabilidade tem se acentuado nos últimos anos. Uma mistura de evolução na legislação brasileira voltada à proteção ambiental e criação de uma economia circular, com o peso cada vez maior que a pauta tem tido junto aos consumidores, leva players como as oficinas mecânicas e as lojas de autopeças a se juntarem à indústria neste processo de amadurecimento. Um dos principais agentes dessa mudança quando falamos do setor privado, o Grupo Supply Service há 30 anos encabeça a luta pela conscientização das empresas ligadas ao setor no que diz respeito à importância da implementação dos preceitos da logística reversa em cada um dos elos da cadeia. Para compreender melhor o grau de amadurecimento de nossos empresários neste sentido, bem como identificar as principais forças motrizes de um processo em franca evolução, a equipe do jornal Novo Varejo, publicação da Novo Meio, conversou com a diretora de Marketing do grupo, Gabriela Opperman, e seu diretor de Operações e Sustentabilidade, Filipe Andrade.
Novo Varejo – Como você tem visto o amadurecimento das empresas brasileiras em relação às regras de descarte consciente de resíduos líquidos e sólidos?
Gabriela Oppermann – O amadurecimento não é espontâneo, principalmente quando falamos das empresas brasileiras. As multinacionais, sim, têm mais essa consciência. Nos segmentos em que nós trabalhamos – que é o do setor de óleos lubrificantes e hidráulicos – ele vem vindo à medida que a legislação vem apertando mais a questão do controle, da aplicação de multas e da fiscalização. As empresas brasileiras ainda são resistentes e acabam preferindo optar por esse descarte consciente dos resíduos devido à exigência legal, seja ela federal, estadual ou municipal.
NV – Dentro do setor automotivo, quais são os segmentos que você aponta como os mais conscientes? Onde se a maior parte dos clientes do grupo Supply Service no momento? GO – No setor automotivo há um movimento muito significativo, que é o da Abrafiltros (Associação das Empresas de Filtros). Eles têm agido de maneira muito importante no sentido de conscientizar o setor no âmbito da logística reversa e firmado parcerias importantes com o poder público para formalizar a adesão das empresas neste processo mais sustentável. Da mesma forma, existe também o movimento da logística reversa no setor automotivo voltado ao descarte das embalagens plásticas contaminadas com óleo. Ele abrange oficinas mecânicas, concessionárias, transportadoras, trocas de óleo em postos de combustíveis. Este movimento vem sendo impulsionado por uma lei que estabelece 100% de responsabilidade ao descarte consciente nos estabelecimentos geradores desses resíduos.
NV – Criado em 1992, o grupo Supply Service é pioneiro na reciclagem de resíduos gerados por diferentes players da nossa economia. De lá para cá, como você tem visto o avanço da legislação do país neste contexto de sustentabilidade?
Filipe Andrade – O ano de 1992 foi também marcado pela realização da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a ECO-92 (ou Rio-92), que, entre inúmeras e importantes abordagens envolvendo assuntos e aspectos socioeconômicos e ambientais, trouxe discussões envolvendo os padrões de desenvolvimento econômico, produção e consumo que causam danos ao meio ambiente e que precisavam ser combatidos. Desde então o mundo passou a encarar as questões econômicas e sociais procurando respeitar e conciliar as questões ambientais em busca da sustentabilidade. O Brasil é exemplo em políticas ambientais, dispondo de diversos órgãos reguladores Federais, como o CONAMA e IBAMA, além de órgãos estaduais como as Secretarias de Meio Ambiente, conferindo constantes avanços nas normativas, nos dispositivos e regulação ambiental, inclusive referente ao transporte de cargas perigosas. Somente em 1998, seis anos após a fundação da Supply Service, é que foi instituída a Lei de Crimes Ambientais pela Lei 9.605-98; existem ainda resoluções do CONAMA específicas para coleta e destinação de óleo lubrificante, de pneus, de pilhas e baterias, legislação para tratamento adequado das embalagens de agrotóxicos, acordos setoriais para a reciclagem de lâmpadas e eletroeletrônicos; em 2010 foram criados importantíssimos instrumentos de regulação da gestão de resíduos sólidos, estabelecendo que deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos. Estabelece ainda o fim dos lixões e cria os instrumentos para viabilizar a Logística Reversa.
NV – Você acredita que as mudanças que tivemos em termos de legislação têm sido importantes para o maior engajamento das empresas na pauta da sustentabilidade ou esta é uma demanda que tem partido da iniciativa privada?
GO – Com certeza. Acredito muito nisso! As legislações, as fiscalizações e as punições daquilo que é crime têm pautado este movimento. Mas tenho certeza que é um caminho sem volta e não veremos mais discussões sobre se vai haver ou não multa.
NV – Pessoas pouco envolvidas com as práticas sustentáveis tendem a fazer uma contraposição entre ‘política de produção ecologicamente consciente’ e a maximização da ‘maior lucratividade possível’. Se observarmos no médio e longo prazo, você acredita que essa relação de concorrência existe? Ou é possível ter ganhos no aspecto econômico a partir de uma política de produção e descarte sustentável?
FA – Essa concorrência entre a ‘política de produção ecologicamente consciente’ e a maximização da ‘maior lucratividade possível’ é algo que vem deixando de existir nos países engajados com a sustentabilidade; com avanço tecnológico na produção industrial, no agronegócio e na prestação de serviços, com maior oferta de tecnologia (em equipamentos e biociência) e com inteligência artificial os equipamentos têm conseguido entregar maior produtividade com menor custo e menor impacto ambiental, gerando menos resíduos; pode-se destacar também o uso cada vez maior de materiais reciclados/recuperados, evitando com isso o consumo de materiais de fonte não renovável e a degradação de fontes de abastecimento.
NV – Como você tem visto o engajamento de empresas de pequena escala nesta pauta do descarte consciente de resíduos líquidos? As oficinas mecânicas, por exemplo, já estão se atentando para a prática? GO – Em especial nos estados de São Paulo, no Paraná, Mato Grosso e no Espírito Santo, o engajamento dessas pequenas oficinas mecânicas é altíssimo. Por isso, a Supply coloca nestas localidades, onde a lei vai avançando, uma pessoa para explicar sobre a parceria, a importância da logística reversa e do descarte. E, neste processo, a gente percebe que a conscientização de que eles fazem parte da continuidade de um processo que foi iniciado lá na indústria, com o fabricante, é imediata. Temos percebido um engajamento e uma adesão muito grande por parte deles.
NV – Quais são as práticas internas que um empresário da reposição automotiva pode adotar em seu negócio para torná-lo mais sustentável?
FA – Uma empresa do setor de reposição automotiva deve dispor em seu estabelecimento de coleta seletiva dos materiais recicláveis; segregação e coleta dos resíduos não recicláveis gerados em sua atividade, tais como embalagens de óleos lubrificantes, filtros de óleo, combustível e ar, EPIs usados, uniformes contaminados, material proveniente de varrição, baterias, lâmpadas, peças automotivas contaminadas, pneus, graxas, Óleo Lubrificante Usado Contaminado – OLUC, líquidos de arrefecimento e fluídos diversos; além de realizar periodicamente a limpeza da Caixa Separadora de Água e Óleo – CSAO, junto a empresas devidamente licenciadas para realizar estas atividades, como é o caso da Supply Service. Outras práticas que podem ser adotadas são aquelas relacionadas ao uso de copos/canecas de vidro para seus funcionários (por permitirem a higienização e reuso), adição de iluminação natural e por Led, energia fotovoltaica, utilização de água de reuso para lavagem de peças e pisos.