Conhecimento das necessidades e expectativas dos clientes e da concorrência são atributos fundamentais que só a inteligência de mercado pode proporcionar
Por Lucas Torres
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A época em que decisões eram tomadas ancoradas exclusivamente nas percepções dos gestores do negócio chegou ao fim. Isso porque, em 2021, as empresas de maior sucesso no cenário mundial têm como premissa indispensável a prática do conceito de inteligência de mercado como ponto de referência para a formulação de suas estratégias e chamadas à ação.
De acordo com o especialista no assunto, Olival Nóboa Leme – fundador da empresa ‘Leme – Pesquisa e Inteligência de Mercado’ –, esse conceito transcende largamente a ideia de conhecer os concorrentes e os dados de consumo do público que se deseja atingir.
Leme afirma que o papel dessa ‘ferramenta’, por assim dizer, é gerenciar todo o conhecimento que tenha relação com o negócio. “É gerenciar os dados e as informações do funcionamento do negócio e também perceber a maneira com que ele está inserido no mercado e sendo percebido por seus consumidores”, afirma o especialista.
Na mesma linha, o consultor empresarial e professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Marcelo Farhat de Araújo, analisa a Inteligência de Mercado como uma ‘ferramenta’ que oferece ao empresário uma perspectiva holística, distribuída em três pilares fundamentais. “Esses três pilares são: conhecimento das necessidades, expectativas e dores dos clientes; conhecimento da concorrência e benchmarking; e planejamento estratégico de mercado”, analisa Araújo.
Em suma, a inteligência de mercado consiste na posse de informações claras que permitam guiar o desenvolvimento e a realização do serviço. Para ilustrar: como você controla a qualidade, a entrega, como você distribui a comunicação, como você projeta e mantém o ambiente – físico ou na web – para o seu cliente, o público em geral.
O que é importante salientar, é que, embora sejam frequentemente confundidos, os conceitos de dados e informações estão longe de possuírem um mesmo significado.
Dados são coletas brutos ou trabalhados a partir de algum enquadramento escolhido. Já as informações são as consolidações de dados ou um conjunto de fatos apreendidos que, passados por um processo de interpretação e contextualização, são consolidados em ‘inteligências’ capazes de guiar decisões relevantes.
Criando diferenciais competitivos
Imagine o seguinte cenário: dois concorrentes do segmento da reparação automotiva disputam a mesma fatia do mercado. O primeiro administra sua empresa à moda antiga, com base em suas impressões do mercado e nos dados consolidados de compra e venda dos produtos e serviços. O segundo, por sua vez, conhece exatamente quais são os pontos fortes e fracos de seus concorrentes.
Mais do que isso, conhece de maneira profunda o comportamento de seu cliente em potencial, não apenas no que diz respeito ao que ele consome e executa no setor, mas também seus hábitos, preferências, desejos e a jornada que ele percorre antes de decidir por um prestador do serviço. É claro que este conhecimento não surge por acaso. Este player realiza pesquisa, acompanha diariamente as mídias de seu mercado, investiga permanentemente as demandas dos clientes, frequenta eventos e seminários e busca incessantemente novos conteúdos e informações.
Para o especialista Olival Leme, é justamente neste segundo cenário que habitam os diferenciais competitivos que as empresas que utilizam a inteligência de mercado como peça central nas estruturas de seus negócios possuem sobre concorrentes que ainda insistem em administrar e gerir por feeling.
O especialista explica que, ao estar munida de informações multidimensionais sobre todos os atores envolvidos com seu ramo de atuação, a empresa tem a capacidade de atuar como um verdadeiro organismo vivo, respondendo constantemente às demandas de seu mercado, bem como identificando possíveis riscos e oportunidades que se apresentarem no horizonte.
“Essa observação constante do mercado permite à empresa permanecer saudável e competitiva em um cenário de constante mudança, tendo como meta a oferta de benefícios que tenham um peso importante para o cliente e que seja vista com valor por este”, reflete Leme, antes de complementar: “O mercado se altera e você precisa ter em perspectiva a necessidade de diferenciação. E para que você possa se diferenciar, é preciso estar muito engajado com seu cliente. Estar pronto para responder com velocidade. E elaborar, transformar, reformar e até mudar completamente alguns procedimentos e inovação do produto”.
Vantagens competitivas da inteligência de mercado
Convidado a oferecer um exemplo prático das vantagens competitivas que se apresentam para uma empresa que faz uso da inteligência de mercado, Marcelo Farhat relata situações em que uma empresa ‘bem informada’ identifica necessidades de seus clientes que, no momento, não são atendidas pela concorrência.
Em sua reflexão, o professor e consultor usa o exemplo de empresa do setor alimentício que lança um produto voltado a atender as necessidades de um grupo específico de pessoas alérgicas a determinados ingredientes utilizados pelas empresas concorrentes.
Farhat cita ainda a habilidade de lidar com a realidade como ela é como uma das vantagens competitivas relevantes das empresas que utilizam a inteligência de mercado. “Obter dados e fatos é fundamental, pois a empresa apoiará suas decisões na realidade. Não adianta se iludir ou fazer estimativas sem base. O conhecimento da realidade reduz a dúvida é facilita o direcionamento”, opina o especialista.
Percebendo a posição de vantagem que a manutenção de um survey constante do mercado em que atua e até mesmo possuir insights-basilares do comportamento da sociedade como um todo, as principais empresas do planeta investem de maneira robusta em ferramentas que se insiram nesse contexto.
Softwares ligados ao Business Inteligence, realização e aquisição de pesquisas quantitativas e qualitativas de seus ramos de atuação e a manutenção de um monitoramento frequente dos canais de mídia são, segundo Olival Leme, parte dos processos cotidianos de qualquer empresa de grande porte na contemporaneidade.
E como proporcionar esse diferencial também às empresas menores, que eventualmente não tenham capacidade de investimento para implementar um ‘pacote completo’ da inteligência de mercado em seus negócios?
Para elas, os especialistas recomendam focar em coletar e sistematizar as informações indispensáveis para uma gestão embasada. Nesse sentido, recorrer a pesquisas externas e solidificar os dados internos que desenhem um panorama geral do comportamento de seu consumidor, se certificar de que empresa e cliente possuem um alto nível de engajamento nos pontos de conexão físicos e digitais, bem como observar e avaliar os processos de venda internos e dos concorrentes devem ser os focos principais de atuação.
Conhecer o cliente em detalhes faz a empresa repensar a maneira como é percebida por ele
A cada ano que passa a frequência da menção do termo ‘propósito’ por parte de consultores e especialistas em gestão moderna de empresas tem sido cada vez mais intensa.
As reflexões sobre a importância de ser percebida como uma empresa que entrega mais do que produtos e serviços para seus clientes, que há alguns anos soavam abstratas para empresários que tinham o ‘curto-prazo da lucratividade’ como norte maior, estão agora tomando forma prática na debandada de consumidores descontentes com o posicionamento do empreendimento em um contexto social mais amplo.
Exemplo recente dessa dinâmica é o massivo cancelamento de assinaturas experimentado tempos atrás por uma famosa rede de academias, fenômeno de sucesso no país no segmento fitness, que viu sua popularidade despencar após a marca ter sido associada ao financiamento de fake news.
Em um ambiente de grande sensibilidade, em que a fronteira da relação mercadológica e a relação pessoal é cada vez mais fluida, conhecer o consumidor ‘para além da relação compra-e-venda’ é fundamental para que a empresa saiba como se posicionar perante seu público.
Segundo Olival Leme, a inteligência de mercado vêm também auxiliar a empresa a ter essa big picture sempre inserida em sua tomada de decisões. “É preciso se certificar que a finalidade, o objetivo e a missão do negócio continuam fortes no mercado; como você se relaciona e se apresenta para o seu consumidor é o que permite com que a empresa sempre mantenha sua marca saudável, pronta para novos desafios”, conjectura o fundador da Leme – Pesquisa e Inteligência de Mercado.