Mobilidade acessível requer uma estrutura regulatória robusta para o mercado de reposição automotiva na Europa e no Brasil

Artigo: Luiz Sergio Alvarenga – Alvarenga Projetos Automotivos

EUROPA

Um estudo conduzido em conjunto com a Berylls pela Alix Partners, em colaboração com a CLEPA e a FIGIEFA, e lançado na Automechanika, examinou dois cenários potenciais que poderiam impactar significativamente o custo de serviço e manutenção de veículos para os consumidores.

O estudo ressalta o potencial de aumento dos custos de reparo à medida que as concessionárias autorizadas ganham maior domínio. Essa mudança é impulsionada por crescentes restrições ao acesso de reparadores independentes a dados, informações e peças de reposição essenciais. Para evitar um aumento significativo nos custos de reparo e manter a mobilidade acessível, uma regulamentação adequada é crucial.

O estudo, que analisou a competitividade do mercado de reposição automotiva europeu até 2035, considerou o impacto de novas tecnologias de veículos, requisitos de segurança cibernética e a mudança para veículos definidos por software. A partir de entrevistas de especialistas com as principais partes interessadas e da própria análise de Berylls, o estudo identifica cinco fatores principais que moldarão o futuro do mercado de reposição:

Disponibilidade limitada de certas peças de automóveis apenas para fabricantes de veículos
A necessidade de codificação ou ativação específica para peças de reposição
Desafios no acesso a informações técnicas para reparos
Interfaces desatualizadas para atualizações de software em oficinas de reparo independentes
Acesso limitado a dados no veículo

O custo do reparo do veículo está aumentando

A substituição de peças defeituosas é um serviço padrão no mercado de reposição. No entanto, a CLEPA e a FIGIEFA observaram um número crescente de peças que só podem ser obtidas de fabricantes de veículos. Essas peças geralmente exigem codificação ou ativação específica, o que pode adicionar custos significativos aos reparos. Com os novos regulamentos de segurança cibernética da UE em vigor desde julho de 2024, espera-se que o número dessas peças aumente, aumentando ainda mais os custos de reparo para os consumidores.

Além disso, o acesso a informações técnicas, que é legalmente exigido, geralmente é limitado ou fornecido em formatos difíceis de usar. Isso aumenta os custos e atrasa os reparos, tornando a legislação atual ineficaz. Para atualizações de software, os reparadores independentes ainda são forçados a usar interfaces de veículos desatualizadas, em vez de interfaces de última geração baseadas em protocolos ethernet.

O consultor sênior de assuntos de mercado da CLEPA, Frank Schlehuber, afirma: “Para garantir que os consumidores mantenham a liberdade de escolher seus prestadores de serviços de veículos, uma legislação robusta que aborde a segurança cibernética, o acesso à informação e a disponibilidade de peças é essencial. Isso ajudará a garantir mobilidade acessível para os cidadãos da UE.”

Cenários de mercado potenciais e seu impacto

O estudo examinou dados de sete países, com um volume total de mercado de € 150,2 bilhões para peças e mão de obra em nível de oficina. Sob o cenário de base de crescimento anual de mercado de 0,7%, espera-se que esse mercado cresça € 161,9 bilhões até 2035. No entanto, se os fabricantes de veículos aumentarem seu domínio, os especialistas preveem que os custos de reparo e manutenção podem disparar para € 197,9 bilhões – um adicional de € 35 bilhões por ano para os consumidores nesses países. Isso tornaria a mobilidade acessível cada vez mais inacessível.

Em um cenário mais equilibrado, onde a concorrência justa é mantida, os gastos do consumidor em reparos e manutenção poderiam ser ligeiramente reduzidos para € 159,8 bilhões. Essa redução seria particularmente benéfica para a adoção de veículos elétricos a bateria, garantindo que a mudança para uma mobilidade mais sustentável permaneça acessível.

O papel da legislação

O desenvolvimento contínuo de tecnologias de veículos está fortalecendo a posição proprietária dos fabricantes de veículos, tornando crucial que os legisladores ajam. A extensão e revisão do Regulamento de Isenção por Bloco de Veículos Motorizados (MVBER) além de 2028 é fundamental para garantir que todas as peças de reposição permaneçam disponíveis para o mercado de reparos independentes. Além disso, um Regulamento de Homologação de Tipo (TAR) inteligentemente alterado que considere a segurança cibernética e garanta acesso irrestrito a informações de reparo e manutenção pode ajudar a reduzir custos para os consumidores. Finalmente, regulamentações sobre o uso de dados no veículo e acesso a recursos do veículo são necessárias para garantir que os consumidores mantenham a liberdade de escolher onde obter serviços.

Fonte: CLEPA

BRASIL

O Brasil mesmo estando alguns passos atrás na tecnologia dos veículos automotores e muitos passos atrás quando se trata de legislação de acesso as informações e diagnósticos para os consumidores ainda conta com uma letargia por parte do mercado que não se atém justamente no que os europeus já estão prevendo, isto é, alguns componentes em função da tecnologia digital e nuvem estarão concentrados nas mãos das montadoras de veículos, alijando todo o canal independente e deixando os consumidores sem escolha.

O mercado brasileiro também é promissor e sinalizando crescimento de dois dígitos para os próximos anos, isto em função do aquecimento na venda de seminovos que resultam em manutenções, além da própria frota circulante que manterá a frota em contínuo reparo, pois as vendas de veículos novos ainda dependem de planos mirabolantes para poderem dar algum suspiro.

Não obstante o baixo volume de novos lançamentos de veículos e pressão das montadoras chinesas com seus elevados estoques impactarão os preços nas vendas de veículos novos, deixando o mercado sob certa tensão, o que favorece ainda mais o pós-vendas.

É preciso muita energia por parte do canal independente para ocupar seu espaço nas discussões de governo, pressionando os parlamentares para que consigamos algumas conquistas vitais para o negócio no futuro. Ficar como espectador e ficar observando as montadoras articularem manobras de renovação de frota, brechas e oportunidades do programa Mover e ganharem tempo para se ajustarem, tornará tudo mais complexo para o Aftermarket brasileiro.

Não se pode perder de vista que o Brasil ainda carrega um déficit na educação básica e a capacitação de profissionais vem se tornando um dos maiores gargalos que o Aftermarket deve enfrentar nos próximos anos, o que nos deixa em posição desvantajosa se comparados a rede de concessionárias que continuam recebendo cargas de treinamentos contínuos e de forma ordenada, ou seja, uma trilha bem estruturada é disponibilizada pelas marcas, distante do que vemos no canal independentes onde as capacitações se misturam com tecno-promoções e cada marca ofertando o seu modelo, sem haver qualquer acreditação central para acompanhar a evolução ou correções necessárias.

Um outro ator não menos importante as seguradoras também enfrentarão problemas, pois com já temos o monopólio de peças externas por parte das montadoras através da Lei do Design, agora com peças tecnológicas necessitando codificações de acesso, aumentarão a concentração das vendas no balcão das concessionárias, podendo haver aumento dos custos e impactando nas apólices de seguros e mais uma vez espremendo correntes de fornecedores entre eles as oficinas.

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